O Distrito de Santo Antônio já sofreu um período de grande angústia: o grave surto de malária registrado no ano de 1967. Não só a Vila, mas toda região ribeirinha do rio Paracatu e afluentes.
Era o mês de março, o pessoal começava a colheita do arroz, principal cultura naquela época. O início quase repentino, mostrou a gravidade da febre; antes já havia registros, embora de uma forma mais branda, sempre repetia todos os meses.
A única medicação na época era o Aralen, composto de cloroquina. Apesar das consequências, não havia outra alternativa. O seu uso provocava uma série de efeitos colaterais, sem contar a dificuldade para ingerir devido o gosto amargo insuportável.
A pulverização das moradias com DDT afastava o inseto transmissor; talvez por causa de um certo controle fez com que esse trabalho fosse interrompido. Repentinamente começaram a surgir casos identificados como Plasmódium Falciparum, o mais grave tipo de malária. As pessoas acostumadas com a malária, a sezão como diziam, de repente começaram a sentir a febre de uma forma muito mais agressiva.
Aquele tempo não havia como hoje o SUS, só havia um médico na sede da Colônia para atender uma população dispersa e sem recursos. A situação foi se agravando, as pessoas esqueléticas, a fisionomia demonstrando o sofrimento. Os trabalhadores na roça muitas vezes eram surpreendidos pela febre, havia a necessidade de levar uma montaria para leva-los até sua casa. Alunos na aula também eram acometidos. Muitos idosos não resistiram e vieram a óbito. O quadro era desolador.
Quando passou a fase mais crítica, vieram as consequências. O uso da cloroquina deixou sequelas; houve necessidade de tratamento prolongado após o surto. Muitos venderam o pouco que possuíam por qualquer preço, mudando-se para longe para tentar a vida em outro lugar.
Hoje diante da polêmica em torno da cloroquina para tratamento da Covid19, fico lembrando como o medicamento, o único na época, era distribuído. Certo dia, procurando o médico (também o único na região), o mesmo entregou-me um recipiente cheio de comprimidos de Aralen e pediu-me que distribuísse a todas pessoas que necessitassem; por aí se vê a carência existente no setor de saúde em toda a região.
Creio ter sido aquela situação a mais desastrosa desde a década de 60; faz lembrar Guimarães Rosa no seu livro “Sagarana”. O tempo passou, os que não sucumbiram, após longo tratamento, conseguiram sobreviver.
Geraldo M Paiva – Agosto/2020
“Ela veio de longe, do São Francisco. Um dia, tomou caminho, entrou na boca aberta do Pará, e pegou a subir. Cada ano avançava um punhado de léguas, mais perto, mais perto, pertinho, fazendo medo no povo, porque era sezão da brava – da ‘tremedeira que não desamontava’ – matando muita gente”.
Sarapalha – Guimarães Rosa, Ed. Nova Fronteira